Gente das Vertentes

Presciliano José da Silva

A história do compositor e maestro que que deixou para o São João del-Rei um rico legado em músicas

publicado: 05/05/2020 15h42, última modificação: 12/05/2020 17h28

Afrodescendente, discípulo do maestro Martiniano Ribeiro Bastos e aluno da escola de Milão, Presciliano José da Silva foi um dos grandes compositores nascidos em São João del-Rei em meados do Século XIX. Sua obra, publicada na Europa e no Rio de Janeiro, ainda hoje é executada em cerimônias católicas da cidade mineira, ao longo de todo o ano litúrgico.

Nascido em 1854, Presciliano era neto de Lourenço José Fernandes Braziel, maestro e administrador de um grupo musical que atuou em São João del-Rei entre o final do Século XVIII e o início do XIX. O conjunto era formado, entre outras pessoas, pelos filhos de Braziel, o que pode ter influenciado diretamente nos estudos, carreira e talento de Presciliano.

Além da família, também há registros de que o compositor conviveu com o maestro Ribeiro Bastos, ilustre músico são-joanense daquele período. O neto de Braziel teria se destacado entre os discípulos de Bastos e chamado a atenção do governo imperial.

Há uma lenda que diz que Presciliano teria entregado uma de suas composições diretamente a Princesa Isabel, durante a visita da família imperial à inauguração da Estrada de Ferro Oeste de Minas – e até mesmo tocado piano para a filha de D. Pedro II. Apesar da pitada de glamour que esta história lhe confere, o são-joanense já não morava mais na cidade à época da visita dos monarcas (1881): ele já vivia do outro lado do Atlântico.

Em 1879, após ganhar uma bolsa imperial para estudar no Conservatório de Música de Milão, Presciliano se mudou para a Península Itálica, onde morou por quatro anos. Teve algumas de suas obras publicadas por lá – consideradas entre as primeiras composições sacras brasileiras impressas na Europa – e também chegou a se apresentar no Teatro Scala de Milão.

De volta ao Brasil, o são-joanense morou e trabalhou em variadas cidades. Primeiro, foi professor de música e maestro da Banda Sociedade Beneficente Friburguense, de Nova Friburgo, no Rio de Janeiro. Logo depois, atuou por cinco anos como Mestre de Música da Escola Normal de Campinas, em São Paulo. Chegou a viver na capital paulista, também lecionando na Escola Normal e, em 1894, retornou para Nova Friburgo.

Ao longo da vida, compôs um rico repertório para orquestra e piano. Apesar de não ser uma obra extensa, é considerada de grande valor musical por diversos estudiosos do tema. O doutor em música e ex-professor do Conservatório Pe. José Maria Xavier, Edilson Assunção Rocha, ao analisar as composições que Presciliano fez para piano, conseguiu encontrar diferentes fases na carreira do músico: a primeira, ainda em São João del-Rei, em que ele expões seus virtuosismos no piano, pretendendo mostrar conhecimentos diversos; e a segunda posterior a sua ida a Europa, já mais maduro e com grande influência da escola milanesa.

Em 1887, período em que ainda estava em Campinas, casou-se com Emilie Sauerbronn, descendente de alemães. Com ela, Presciliano teve duas filhas que, ainda jovens, morreram de tuberculose.

O professor do departamento de música da Universidade Federal de Juiz de Fora, André Pires, que pesquisou os trabalhos de Presciliano em sua tese de doutorado, relembra ainda os dramas pessoais do compositor, que sofreu preconceito e discriminação. Segundo Pires, o casamento do músico são-joanense não foi aceito por nenhuma das famílias.

Para os pais de sua esposa, brancos de raízes alemãs, a união era inadmissível. Não aceitavam o fato da filha se casar com um negro descendente de escravos. Já do lado de Presciliano, a família, tradicionalmente católica, não aceitava o fato de sua mulher ser uma protestante luterana. Ambos acabaram por se afastar de seus familiares.

O talento e a competência sempre falaram mais alto na vida do compositor e maestro. Após 25 anos morando em São João del-Rei durante a infância e juventude, Presciliano alçou voos bem mais longos, fazendo carreira internacional e em diversas localidades do Brasil. Foi fundador da Banda da Sociedade Carlos Gomes e do Clube Musical Sete de Setembro, além de regente da Banda Campesina Friburguense, entre outros feitos.

Presiciliano José da Silva faleceu em algum momento próximo ao ano de 1910. A data exata e o local de sua morte são desconhecidos, já que não existem registros nem em São João del-Rei, nem em Campinas. Pires, em sua tese, levanta a hipótese de Presciliano ter à Nova Friburgo. Mesmo que não saibamos a localização de seus restos mortais, um fato é incontestável: mais de cem anos depois, sua obra ainda ecoa pelas igrejas históricas de São João del-Rei a cada nova solenidade litúrgica.

FONTES:
Presciliano Silva e Francisco Valle: distintos românticos (tese de doutorado de André Luis Dias Pires)

Presciliano Silva: evolução da técnica composicional para obras ao piano de um compositor são-joanense (artigo de Edilson Assunção Rocha e Simone Raimundo de Souza)

O inventário de um músico são-joanense do século XVIII: Lourenço José Fernandes Braziel (artigo de Aluízio José Viegas)