Um são-joanense quase desconhecido na cidade acompanhou o físico Albert Einstein, que visitava o Brasil em 1925. Natural de São João del-Rei, José Carneiro Felippe não foi escolhido de forma aleatória para compor a comitiva do cientista alemão. Naquele ano, seu nome já figurava em cargos ilustres de grandes instituições governamentais e de pesquisa do país, como o Instituto Oswaldo Cruz, o Departamento Nacional de Ensino e o Ministério da Educação e Saúde.
Filho de um empreiteiro da Estrada de Ferro Oeste de Minas, Carneiro Felippe nasceu em 1886. Em uma família de boas condições financeiras, o pequeno Juca – como ficou conhecido durante a infância – não se importou com estudos quando era criança e somente aos 10 anos demonstrou interesse pelo aprendizado, pedindo aos pais para ser matriculado em uma escola.
Aos 15 anos, entrou para o Ginásio Mineiro, em Barbacena – um internato reconhecido como uma das melhores instituições de ensino do Estado. E foi ali que o jovem são-joanense demonstrou interesse pelas ciências.
Em um período em que a iluminação elétrica das vias públicas era ainda novidade, Juca foi atraído pelo sistema de iluminação à gás e, para suprir as necessidades da própria família, o adolescente trouxe para São João del-Rei algumas tubulações e galões e montou na casa de seus pais o primeiro sistema de iluminação a gás da cidade.
Continuou os estudos em Ouro Preto, tornando-se bacharel em Ciências e Letras e, mais tarde, em Engenharia de Minas, Metalurgia e Civil. Os bons resultados lhe renderam como prêmio uma viagem para a Europa, mas Juca recusou o presente. Em São João del-Rei, seu pai estava doente e incapacitado e o jovem estudante precisava assumir os cuidados da família.
Ele permanece em sua cidade natal por poucos meses e, em 1916, se casa com Jenny Isaacson, filha de ilustres moradores do município. Na mesma época, é nomeado diretor da Escola de Minas de Ouro Preto e assume a chefia das obras de saneamento de São João del-Rei. A implantação das estruturas de esgoto e abastecimento era um trabalho de grandes proporções, que se arrastava desde a década de 1880. Carneiro Felippe, no entanto, concluiu as obras com tal maestria que foi convidado a ser diretor do Laboratório de Análises Clínicas e Microscópicas de Belo Horizonte.
Dali em diante, o são-joanense alçou voos ainda mais altos. Entre 1919 e o início da década de 1930, acumulou mais de dez cargos de direção, chefia, pesquisa e ensino em algumas das instituições mais renomadas do país, como a Fundação Oswaldo Cruz, a Escola Politécnica do Rio de Janeiro, o Centro Internacional de Leprologia da Liga das Nações e a antiga Universidade do Brasil (atual UFRJ), entre outras. Também assumiu funções no governo, em entidades como o Serviço de Medicamentos Oficiais do Brasil, além de membro interino do Conselho Nacional de Educação e a direção do Gabinete do Ministro da Educação e Saúdo e do Departamento Nacional de Ensino.
Em 1925, o mundialmente famoso físico alemão Albert Einstein, criador da Teoria da Relatividade, visitou rapidamente o Brasil, passando uma semana no Rio de Janeiro. Na antiga capital, o cientista realizou conferências na Academia Brasileira de Ciências e visitou alguns locais da cidade. Carneiro Felippe foi um dos que acompanharam Einstein em sua visita à Fundação Oswaldo Cruz e em algumas apresentações.
No ano seguinte, em 1926, outra ganhadora do Prêmio Nobel visitou o Brasil e Carneiro Felippe também esteve presente na conferência realizada na Escola Politécnica. Marie Curie, conhecida por seus estudos com radiação e raios-X, foi a única pessoa laureada duas vezes com o Nobel e o são-joanense pode conhece-la pessoalmente.
Na fundação Oswaldo Cruz, Felippe também foi professor do ilustre médico e pesquisador Carlos Chagas – o homem que descobriu a Doença de Chagas e o único cientista da história da medicina a descrever sozinho todo o ciclo de uma doença.
José Carneiro Felippe morreu em 1951, ao 65 anos. Deixou 11 filhos e uma vasta carreira científica e administrativa. Em seu enterro, estavam presentes não apenas familiares e amigos, mas também políticos, jornalistas, professores, cientistas, colegas de trabalho e muitos de seus alunos e ex-alunos.
Após sua morte, foi instituída a Medalha Carneiro Felippe, destinada a premiar brasileiros que contribuíram para o desenvolvimento das aplicações pacíficas da energia nuclear no país. A biblioteca do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas e o auditório da Comissão Nacional de Energia Nuclear receberam o nome de José Carneiro Felippe. A cidade do Rio de Janeiro o homenageou, dando a uma de suas vias o nome de Rua Professor Carneiro Felippe. O legado deste são-joanense continua vivo na memória da ciência brasileira.
Por Brenda Guerra e João Victor Militani